Surgiu nesta terça-feira (15) o primeiro fortíssimo candidato ao Urso de Ouro no Festival de Berlim. É “Nader and Simin – a Separation”, filme iraniano dirigido pelo mestre Asghar Farhadi.
Asghar estarreceu a crítica, que o aplaudiu efusivamente ao final da sessão e terá trabalho para descrever em palavras a obraprima que ele apresentou neste festival. Já havia dado uma aula de cinema com seu filme anterior, “Procurando Elly”, e agora retorna com uma obra ainda mais densa, de todo e quaisquer detalhe impecável.
A primeira cena mostra o casal Nader e Simin em frente a um juiz, discutindo sua separação. A mulher quer sair do país e levar sua filha para ser criada em algum lugar onde as regras não sejam tão opressoras quanto no Irã. O juiz não vê motivo para conceder a separação, já que o casal não tem nenhum conflito entre si. Ela (Simin) deixa o lar e o marido precisa contratar uma mulher para cuidar do seu pai, que sofre Mal de Alzheimer. Mas Nader não sabe que a nova empregada não só está grávida como também está trabalhando sem a permissão e consciência do marido.
Depois de alguns acontecimentos, Nader se vê envolvido numa teia de mentiras, manipulações e confrontos públicos.
O diretor constroi uma trama intrigante, usando brilhantemente os elementos que o cinema oferece, colocando elipses no momento certo, diálogos calculados para manter o suspense e só concederem informações no momento certo. A todo momento, surpreende o espectador com novas revelações e o mantém não só atento como tocado por aquela história.
Cada personagem ali é de extrema importância e têm suas ações compreensíveis no contexto da cultura iraniana. Eles mentem pela religião, por medo de Alá (o deus deles), tomam decisões baseados nisso, mentem novamente por medo da sua reputação perante a sociedade ou à família e só aumentam a sua cota de pecados.
Farhadi critica os costumes e a religião do seu país sem precisar ser agressivo. Simplesmente mostra a situação com naturalidade. Se um iraniano assiste ao filme, pode achar tudo completamente normal, mas um ocidental tomará aquilo como crítica, dado o seus conceitos contrários àquelas práticas.
O drama é tão denso que seria cruel dizer que este ou aquele personagem está errado. Cada um nos toca de um forma diferente e à vontade que se tem é de interrompê-los e dizer “pelo amor de Deus, se perdoem, se compreendam”. É difícil conter as lágrimas. A sensação de impotência, de ser um mero espectador, deixa o público com um gosto amargo na boca.
“Nader and Simin – a Separation” é uma obra singular, um modelo de construção de roteiro e personagens e de como se fazer cinema, de como se fazer arte. Que Farhadi se mantenha incólume às leis iranianas e que não aconteça a ele o que aconteceu a Jafar Panahi (condenado a ficar 20 anos afastado do cinema, por supostamente fazer propaganda contra o governo iraniano).
É bom lembrar que Asghar já tem prestígio em Berlim – levou o Urso de Prata de direção em 2009, com “Procurando Elly” - e pode agora ter sua obra definitivamente consagrada. Sua glória pode ser também uma afirmação do clamor do Festival pela liberdade de expressão no Irã. Os concorrentes que se virem para tirar o prêmio de Asghar.
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