Contestar e pedir por justiça foi o que fizeram os diretores Marcela Said e Jean de Certeau de “El Mocito”, documentário chileno exibido no sétimo de Berlinale. Exibido para uma plateia de cerca de 500 pessoas que lotaram um dos cinemas do festival, o filme foi assistido no mais absoluto silêncio, tão envolvente foi a história do seu retratado.
Jorgelino Vergara foi ajudante de torturadores que trabalhavam para a DINA e a CNI, órgãos repressores da ditadura Pinochet. Adolescente à época, servia cafezinho aos torturadores e fazia pequenos favores, enquanto eles torturavam e executavam pessoas. Marcado na sua comunidade por ter “corroborado” com tais horrores, envelheceu sem nunca ter conseguido um trabalho decente, depois que a ditadura se foi.
“Éramos jovens obrigados a fazer aquilo pela ditadura que servíamos. Você vai me chamar de assassino por isso?”, diz o arrependido personagem, numa fala que abre o filme. “Eu procurava um personagem que fosse sincero com o que fizera na época, mas só encontrava pessoas más e/ou mentirosas. Sentia sempre algo ruim perto delas. Foi então que o nosso pesquisador e nosso assistente, Javier Ignacio Rebollero, encontrou o Jorgelino e percebi imediatamente que ele seria nosso personagem”, conta a diretora Marcela Said, após a sessão.
A equipe do documentário leva o ex-ajudante até um juiz, para que ele veja se é possível conseguir uma indenização, por aquela época ter-lhe deixado traumas profundos e ter sido condenado pela vida por isso. É ali, de frente para o juiz, que ele responde questões esclarecedoras. E é revisitando locais de tortura que ele explica em detalhes como as sessões ocorriam. São depoimentos fortes e honestos.
Este é um dos casos em que a função do documentário extrapola a simples exposição de fatos ou história contada. “El Mocito” teve uma importância nacional e ajudou aquele homem arrependido a se redimir, depois de passar a vida orando, pedindo perdão e acordando todos os dias se forçando a dizer para o espelho que ele poderia ser um homem bom e fazer algo pelos Direitos Humanos. E foi com a ajuda da equipe do longa que ele o fez, num feito que só é revelado na cartela que encerra o documentário.
Esta é uma bela história de arrependimento e redenção, um clamor por justiça e incentivo para que outros pudessem fazer o mesmo pela sociedade chilena.
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