Quando “Lula – o Filho do Brasil” foi lançado nos cinemas, em janeiro de 2010, eu optei por não assistí-lo naquela época e contexto e publiquei um texto explicando o porquê. Fui criticado por uns, elogiado por outros, como era de se esperar. Quase um ano depois, resolvi finalmente conferir o longa de Fábio Barreto e Marcelo Santiago e constatei que eu estava certo com o que pensava.
Sob tantos boatos escandalosos sobre a arrecadação de seu orçamento e a acusação de ser um filme eleitoreiro, além do fato do presidente já estar, naquela época, antecipadamente e irregularmente fazendo campanha para sua sucessora Dilma Roussef, a intenção óbvia de usar o filme como cabo eleitoral naufragou. A crítica o detonou e o público não compareceu aos cinemas como o esperado, tornando o maior orçamento da história do cinema nacional em um dos grandes fracassos do ano.
Se lançado hoje, após as eleições e com Lula já fora do poder, num contexto em que ele sai da presidência com 80% de aprovação da população, a imprensa fazendo rios de matérias exaltando-o e toda a tentativa de estabelecer-se um novo herói nacional, o filme teria, sem sombra de dúvidas, despertado o interesse de mais gente e sua arrecadação poderia ser maior.
Estratégias de lançamento e contextos à parte, vamos então ao filme em si.
Nascido em 1945, no município de Caetés, no sertão nordestino, Luís Inácio da Silva, seus irmãos e sua mãe Lindu foram maltratados por seu pai por muito tempo, até que a matriarca decidiu levar os filhos para tentar a vida em São Paulo. Formou-se num curso para torneiro mecânico, casou-se e ficou viúvo, além de perder um filho. Teve irmão sequestrado pela ditadura militar, tornou-se líder sindical, casou-se novamente, candidatou-se três vezes, sem sucesso, à presidência do Brasil e o resto é história.
Com uma trajetória de vida tão cheia de dificuldades e tragédias, Lula é o retrato de muitos brasileiros e o espelho da vontade de todos de vencer e ser alguém na vida, mesmo que suas condições financeiras e pessoais não ajudem. Por isso é uma história de identificação com o brasileiro, em especial.
No livro homônimo de Denise Paraná, no qual o roteiro foi baseado, provavelmente os fatos e o desenvolvimento dos personagens foram melhor explorados e explicados. Ao adaptar a história para o cinema, com a vontade de enfiar o maior número de tragédias possíveis em pouco mais de duas horas de película, os roteiristas Fernando Bonassi, Daniel Tendler e a própria Denise Paraná se perderam e não desenvolveram bem nenhum dos momentos da vida do retratado. O resultado foi um filme raso, corrido, de narrativa novelesca e atropelado como um episódio de “Por Toda a Minha Vida”.
Devido à falta de espaço para se mostrarem, os personagens viraram estereótipos, como o pai demônio, a mãe santa e o protagonista anjo, sem um único defeito sequer. Lula é sempre o inocente de todos os fatos, retratado como um deus enviado à terra para salvar o Brasil, um filho perfeito, líder limpo, estudioso sem fim (?), inteligente, marido romântico e por aí vai. Suas boas qualidades podem ser muitas, mas não há cristão que não tenha defeitos. Ingênuo é aquele que acredita em tanta bondade e inocência.
Mas nem só de atropelos vive esta cinebiografia. A grande quantidade de locações foi bem explorada, assim como o uso inteligente de imagens de arquivos, mescladas às sequências do movimento sindical, além da atuação excelente de Glória Pires, como a mãe do presidente, uma mulher que merecia um filme só para si.
Engolido pela própria ambição e pelos equivocados propósitos, “Lula, o Filho do Brasil” tornou-se um dos grandes micos de 2010, apesar de ser uma obra interessante para quem nada conhece sobre a vida de um dos presidentes mais populares do Brasil. Um filme refém do seu contexto, prisioneiro da própria armadilha. Portanto, merecedor daquilo que provocou: o fracasso.
Trailer:
(idem, Brasil, 130 minutos, 2009)
Dir.: Fábio Barreto e Marcelo Santiago
Com Glória Pires, Rui Ricardo Diaz, Juliana Baroni
Nota 4,0
5 comentários:
Concordo que é um filme cheio de limitações, mas não é a catástrofe que foi pintada pela crítica. Achei a atuação do protagonista bem competente. Na parte técnica ele não decepciona de forma alguma. Por ter um teor (que foi suavizado) político ele gerou comportamentos tão inflamados, seja para defendê-lo ou para condená-lo. Acho uma experiência válida.
Abraços,
Concordo com tudo! Tudo mesmo! Assisti no cinema; não me arrependi mas... Rsrs!
Ah! Mas a Glória Pires é uma das maiores atrizes do Brasil! Sensacional!
Amplexos, Fred!
Caíque, não é nenhuma catástrofe, mas se contentar em não ser uma catástrofe, para uma história boa e de alcance mundial, é muita mediocridade.
Magno, que bom. Ainda bem que o filme tem a Glória Pires!
Abraços!
Os "equivocados propositos" e tudo o que se relaciona a Lula impediram-me de desfrutar o prazer de aplaudir mais uma atuação de Gloria Pires. Estou feliz pelo seu retorno e conferindo o que vi de 2011 /2012 para otimizar minhas horas de cinema. Sucesso nos estudos!
LucAble, muito obrigado pelos desejos de sucesso.
Quanto a aplaudir Glória Pires, este ano vocês terão a oportunidade de fazê-lo de pé, com a atuação dela em "Flores Raras", do Bruno Barreto.
Abraço
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