Pois bem, ele sabia o que estava fazendo. O filme teve apelo popular suficiente para se tornar sucesso de qualidade, com mais de 300 mil espectadores, marca bem alta para os padrões de um filme independente. Foi tão bem que depois ainda rendeu um seriado na Rede Bobo, igualmente engraçado.
Seu antigo grupo conta com um elenco excelente, artistas detentores das melhores interpretações do filme, apesar deste contar com participações de artistas globais de peso, como Dira Paes (igualmente excelente), Wagner Moura (outro soteropolitano competente, mas que aqui não serviu para muita coisa) e Stênio Garcia, apagado em meio a tanto entrosamento do restante do elenco.
Os anos de peça e a sintonia adquirida entre os atores tornou possível desenvolver uma naturalidade tão grande que é difícil encontrar algum momento em que o filme perca a sinestesia. Mas é Lázaro quem dá um show, voltando às raízes que o revelaram com Madame Satã, declarando, através da interpretação, seu amor pela terrinha que o revelou.
É a história de um cortiço em Salvador, mais especificamente no Pelourinho, que fica ainda mais em rebuliço às vésperas do carnaval, com as figuras mais esquisitas e o lado mais fanfarrão e malandro aflorando em cada um ali presente.
Toda essa confusão armada serve como pano de fundo para mostrar que no carnaval não acontecem somente coisas boas. O crime e o tráfico acontecem com mais força que de costume, os esquemas de bandidagem se armam e tudo convive, em certos momentos até respeitando o espaço da folia e do fervor religioso daqueles que excomungam a festa, dizendo que aquilo é obra do chifrudo (não deixa de ser, mas de vários chifrudos e de outra espécie!). Em outros momentos, um invadindo o espaço do outro.
Mas felizmente o que toma conta do filme é o clima de festa que impera na Bahia e isso transparece ao público em cada fotograma.
Os vinte minutos que introduzem a história são excelentes, de uma eficiência e fluidez perceptível, o que me fez pensar: “-Que legal, o cinema nacional já evoluiu à esse ponto de cuidado narrativo!”
A trilha sonora age, naqueles que não gostam de carnaval, da mesma forma que quando estes vão lá: envolvem-se e libertam-se dos preconceitos. Para os que já gostam de axé, forró, calypso, afroreggae e todos os ritmos misturados do nordeste, resta-lhes curtir ainda mais. E comemorem aqueles que já enjoaram de ouvir Caetano Veloso em trilhas de filmes (culpa da produtora Paula Lavigne - ex-mulher do cantor - e sua Natasha Filmes, que acha que em TODOS os projetos que banca tem que dar uns trocadinhos a mais para Caetano): a música dele só toca quando os créditos sobem, daí você poderá desligar o dvd ou assistir os extras sem o menor problema.
Enfim, fluidez perfeita, Ó Pai Ó, alegria é seu nome, mesmo quando há tragédia no show da vida. É baianidade à flor da pele, é energia boa, são personagens memoráveis e é isso que enaltece o Brasil e seu cinema. E o negro é lindo, a Bahia é linda e o filme também, vixe?!
Ó Paele, Ó!
Dir.: Monica gardenberg
Com: Lázaro Ramos, Dira Paes, Wagner Moura, Stenio Garcia e Bando de teatro Olodum
Nota 8,7